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PARTE V
Felizmente, os nossos Pais existem, entre outras salutares razões, para no-lo relembrar vezes sem conta ; essa é, de facto, a sua Verdade : ensinar-nos a ver, no invisível, aquilo que é realmente essencial para nos completarmos, um dia. É como se as Mães partilhassem do lema “Querer crer”; e os Pais, em ambiente de inconsciente complementaridade, da máxima “Crer Querer”. Será que para o Deus-Pai, o Amor brota da Verdade ? E para o Deus-Mãe, será que a Verdade é o fruto desejado, nascido do Amor incarnado no seio do Seu próprio ventre ?
O fundamental de tudo isto reside no simples facto de que, os nossos filhos, constituem, motu proprio, chamamentos da própria Vida : vêem por nosso meio, mas não de nós ; e apesar de estarem connosco, não nos pertencem em regime de exclusividade. Podemos até acolher seus corpos, mas não as suas almas : porque suas almas habitam a Casa do Amanhã, que não nos é autorizada visitar, nem mesmo em sonhos. O que devemos fazer é esforçarmo-nos para ser como eles, e não tentar fazê-los como nós. Creio, inclusive, que o caminho que nos cabe percorrer, não poderá passar ao lado do pensamento do teólogo indiano, Ananda Coomaraswamy, condensado no sábio encore dos campus teológicos : “ Nenhum ser consegue alcançar um grau superior sem deixar de existir”.
Difícil à primeira vista, mas nem por isso deixa de ser o mais correcto.
O mais interessante nesta espécie de epifania, é constatar um dado tenazmente ancestral : o Pai e a Mãe, na sua natural Autoridade ( no sentido de Co-Autores da Vida ), constituem, no seu quotidiano relacionamento, uma outra balança a equilibrar com arqui-subtil delicadeza, sob pena de o Filho vir a sentir dificuldades, na hora de prestar contas à Vida. Sem qualquer sombra de dúvida, tornou-se bem nítido que a Família, hoje denominada nuclear por contraposição à tradicional família alargada, é um tipo de máquina simplesmente mais complexa : ao ter menos candidatos a referências marcantes, os papéis que os progenitores desempenham torna-se, a título de corolário, necessariamente primordial.
Por mais que nos custe a aceitar, muitos são os lares desamparados por esse mundo fora, e muitas são as Crianças e Jovens que vivem sob a ditadura da monoparentalidade ou submersos pela anarquia do mais desumano abandono ; e na revolta, - também ela reviravolta - invertem os pólos deste triste regime político, alegando a anticonstitucionalidade do código moral tido como princípio de hierárquica autoridade.
Em popular cantochão, sinto-me solicitado a dizer “das duas uma” : ou bem que o Amor não tem os alicerces da Verdade e sucumbe à mínima rajada de vento que surja ; ou nem sequer existe Verdade, e desta forma, custará muitíssimo a acreditar na Alegria, que só o Amor é capaz de criar.
A par das novas múltiplas relações consideradas, já actualmente, de tipologia familiar, não só os exemplos dados pelos pais acabam por não ser os melhores, em muitas das ocasiões - por mais que me custe afirmá-lo -, como também, e parece-me uma incontestável evidência, não há uma convergência uniforme em torno das questões estruturantes, ditas de princípio : o Pai e a Mãe, à frente dos seus próprios Filhos, chocam “alhos contra bugalhos” nas circunvalações do seu quotidiano. Como todos compreenderemos, tal cenário só pode vir a tornar-se insuportável para qualquer Criança, com veleidades de ter uma vida condigna. Em nome da Verdade radicalizada, apresentamos duas candidatas a verdades e, quase de certeza, um amor depauperado. Sim, porque uma casa dividida, é sempre um barco sem leme. Sim : um barco sem leme, não tem timoneiros.
Interligado a este fenómeno recente, acresce um outro motivado pelas fortes pressões culturais dos novos tempos : o cair em desuso do modelo de sociedade patriarcal, reportado ao período Neolítico, que fez com que o Pai começasse a assistir ao triste eclipsar da Sua figura. Tem-se a forte impressão de que, actualmente, os Pais são avós dos seus próprios filhos ; a verdade é que o clássico conflito de gerações parece estar a querer alargar, ainda mais, o seu raio de influência, desta vez, temo que em moldes pouco abonatórios para os baluartes ditos humanistas.
Com este dado adicional, talvez propendamos a pensar na verosímil possibilidade de ser mais difícil educar, no momento presente : é que a espinal medula dos tempos pós-modernos, comummente etiquetada de relativismo axiológico, erguida por um caldo - não sei se verde, pelo menos seria sinal de esperança - de culturas muito afastadas umas das outras e temperada, como se não bastasse, por uns media mais preocupados com o entretenimento do que com a formação, não dá tréguas à juventude, e muito menos aos pais e educadores, em geral. O Absoluto, por mais paradoxal que nos possa efectivamente parecer, é decalcado no novo dogma das sociedades ocidentais contemporâneas sob o slogan : “A Verdade é relativa.” Eu contrabalançaria, de imediato, protelando o xeque-mate iminente, o contra-recíproco aforismo : “A Mentira é, pois, absoluta !”.
Bom, em que é que ficamos no meio deste paralogismo, democraticamente ingovernável ?
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